Após quase uma década em trâmite no Congresso nacional, no dia 1º de abril de 2021, a Lei nº 14.133/2021, apelidada de Nova Lei de Licitações, foi sancionada pelo Presidente da República com 26 vetos.
A Nova Lei de Licitações vai substituir as normas que versam sobre licitação e contratações públicas, até então disciplinadas essencialmente pela Lei de Licitações (Lei nº 8.666/93), pela Lei do Pregão (Lei nº 10.520/2002) e pelo Regime Diferenciado de Contratações – RDC (Lei nº 12.462/2011). A Nova Lei de Licitações já está em vigor, podendo ser aplicada pela Administração Pública, contudo, não revogou de imediato as demais normas – o que ocorrerá daqui a dois anos.
À parte das críticas quanto aos avanços que poderiam ter sido promovidos pela mudança legislativa, alguns, inclusive, incorporados no texto do Projeto de Lei e aprovados pelo Congresso Nacional, mas vetados quando da sanção presidencial (por exemplo a obtenção de licença prévia antes da publicação do edital e a obrigatoriedade de depósito em conta vinculada dos valores necessários para custear as respectivas despesas nas contratações de obras), merecem reconhecimento iniciativas positivas trazidas pela Nova Lei de Licitações.
Notório, por exemplo, o intuito da Nova Lei de Licitações de trazer para as contratações públicas uma maior adequação ao mundo digital, tanto no aspecto procedimental dos processos licitatórios, quanto no bojo da própria contratação, fomentando a contratação de inovações tecnológicas. A Nova Lei de Licitações também esclarece em definitivo dúvidas quanto à abrangência das entidades sujeitas à sua aplicação, dispondo expressamente que as suas regras não se aplicam às empresas públicas, as sociedades de economia mista e as suas subsidiárias, as quais são regidas pela Lei das Estatais (Lei nº 13.303, de 30 de junho de 2016).
Nota-se também uma preocupação em garantir uma maior eficiência e adequação às contratações públicas, incorporando aos objetivos da lei a finalidade de assegurar a contratação cujo resultado seja mais vantajoso – reforçando o real intuito da premissa da “seleção da proposta mais vantajosa” fixada pela Lei nº 8.666/93. Além disso, a nova norma zela pela transparência dos processos de contratação e coibe a prática de crimes em contratações públicas.
Destacamos abaixo 10 iniciativas relevantes trazidas pela Nova Lei de Licitações que ilustram um pouco o novo panorama das contratações públicas:
1 – Criação do Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) e Adequação às Novas Tecnologias
Com o intuito de adequar os meios de contratações públicas ao ambiente digital, a Nova Lei de Licitações estabelece, como regra geral, a realização de licitações preferencialmente sobre a forma eletrônica, admitindo, excepcionalmente, a utilização da forma presencial, desde que motivada (art. 17 § 2º). A Lei também prioriza a divulgação de informações relativas às licitações por sítios eletrônicos oficiais, em detrimento da exigência de veiculação em jornais de grande circulação previsto na Lei nº 8.666/93, e prevê a possibilidade de formalização de contratos por via eletrônica (art. 91, § 3º).
Outra inovação de destaque é a criação do sítio eletrônico oficial denominado Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), por meio do qual serão divulgadas, de forma centralizada, informações acerca das contratações públicas como, por exemplo, editais de credenciamento e de pré-qualificação, avisos de contratação direta, editais de licitação e contratos celebrados. Além dessas funções, o Portal também poderá servir como plataforma para a realização de contratações pelos órgãos e entidades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário de todos os entes federativos.
2 – Inovações nas Modalidades de Contratação
Na Nova Lei de Licitações, o critério para definir a modalidade de contratação deixa de ser o valor envolvido e passa a ser a natureza do objeto a ser contratado. Nessa lógica, a Lei extinguiu as modalidades tomada de preço e convite. Além disso, a Nova Lei criou uma nova modalidade de contratação que poderá auxiliar contratações em que a Administração Pública possa precisar do know how de particulares para atingir a finalidade pretendida: o diálogo competitivo.
Em linhas gerais, essa nova modalidade é restrita para as contratações que envolvam inovações tecnológicas (art. 32, I), e para os casos em que a Administração Pública verifique a necessidade de definir e identificar os meios e as alternativas que possam satisfazer suas necessidades, especialmente no tocante a aspectos técnicos e aspectos da estrutura jurídica ou financeira do contrato (art. 32, II).
3 – Nova Sequência das Fases da Licitação
Na Nova Lei de Licitações, a fase de habilitação será, como regra, posterior à fase de julgamento (art. 17, § 1º). A novidade, prevista na Lei de Concessões (Lei nº 8.987/95) como inversão de fases (art. 18-A) e até então exceção na antiga Lei de Licitações (art. 43), trará maior celeridade aos processos licitatórios.
4 – Critério de Julgamento
Na antiga Lei de Licitações havia 4 critérios de julgamento, quais sejam: menor preço; melhor técnica; técnica e preço e maior lance ou oferta. Na Nova Lei de Licitações houve a incorporação do critério de maior desconto, previsto na Lei do Pregão Eletrônico, e instituição do critério melhor técnica ou conteúdo artístico.
Adicionalmente, o critério de julgamento de maior lance passa a ser exclusivo para a modalidade Leilão, diferentemente da antiga Lei de Licitações em que também era aplicável às Concorrências.
Por fim, a Nova Lei de Licitações trouxe um novo critério de julgamento: o de maior retorno econômico. Trata-se de critério utilizado apenas para a celebração de contrato de eficiência, em que o contratado será remunerado conforme o benefício gerado para a Administração Pública (arts. 33 e 39).
5 – Dispensa de Licitação por Baixo Valor
Na lógica da Nova Lei de Licitações, com a extinção da modalidade convite, não há mais a hipótese de dispensa de licitação para contratações até 10% do valor da modalidade extinta, conforme previa a Lei de Licitações (art. 24, I e II). A partir de agora, os casos de dispensa de licitação com base no critério de valor, possuem valores fixos definidos.
No caso de obras e serviços de engenharia ou de serviços de manutenção de veículos automotores, é dispensável licitação para contratação que envolva valores inferiores a R$ 100.000,00. Já para os casos de outros serviços e compras, o valor não pode superar R$ 50.000,00 (art. 75).
6 – Dispensa de Licitação nos Casos de Emergência
Na Lei de Licitações, o prazo máximo da contratação emergencial era de 180 dias (24, IV). Na Nova Lei de Licitações, o prazo máximo foi estendido, passando para um ano. Somando-se a essa novidade, a Nova Lei de Licitações proíbe a recontratação da empresa que já tenha sido contratada com base nessa hipótese de dispensa (art. 75, VIII).
Além disso, interessante pontuar a novidade trazida na Nova Lei de Licitações no tocante às contratações emergenciais por dispensa com objetivo de manter a continuidade do serviço público. Nesses casos, a Nova Lei de Licitações estabelece que deverão ser adotadas as providências necessárias para a conclusão do processo licitatório, e determina a apuração de responsabilidade dos agentes públicos que deram causa à situação emergencial (art. 75, § 6º).
7 – Novas hipóteses de Inexigibilidade de Licitação
A Nova Lei de Licitações traz mais uma hipótese ao rol exemplificativo dos casos de inexigibilidade de licitação. O credenciamento – prática em que a Administração Pública convoca profissionais dispondo-se a contratar todos os interessados que preencham os requisitos por ela exigidos, e por um valor previamente definido, de modo que não haja competição entre os interessados – até então carecia de base legal específica, respaldando-se genericamente na “inviabilidade de competição” prevista no caput do art. 25 da antiga Lei de Licitações. Com a Nova Lei de Licitações, o credenciamento, prática cuja legalidade foi amparada nas orientações do Tribunal de Contas da União, foi inserida expressamente em uma das hipóteses de inexigibilidade de licitação (art. 74, IV).
Outra novidade é a mudança de tratamento para fins de aquisição ou locação de imóvel cujas características de instalações e de localização tornem necessária sua escolha. Essa hipótese, que na Lei nº 8.666/93 era caso de dispensa de licitação (art. 24, X), foi melhor enquadrada na Nova Lei de Licitações, passando a compor hipótese de inexigibilidade de licitação, na linha do que já preconizava boa parte da doutrina.
8 – Dispensa de licitação fracassada e deserta
Na Nova Lei de Licitações foi incluída a possibilidade de contratação por dispensa de licitação nos casos de licitação fracassada tendo em vista que as propostas apresentadas no certame foram inválidas. Antes, só era possível quando os preços ofertados eram manifestamente superiores aos preços oficiais e não houvesse retificação das propostas pelos licitantes, cenário em que a Administração poderia adjudicar o contrato pelo preço de mercado. Ressalte-se que, nesse caso, a contratação por dispensa deverá ocorrer dentro do prazo de um ano da licitação fracassada, e mantidas as condições definidas no edital da licitação fracassada (art. 75, III).
9 – Regras de Alienação
Na Nova Lei de Licitações, para alienação de bens em que for necessária a realização de licitação, as regras das modalidades a serem aplicadas, a depender do objeto da alienação, foram simplificadas, passando o leilão a ser aplicado tanto para bens móveis quanto para imóveis (art. 76).
10 – Preços Manifestamente Inexequíveis
Na Nova Lei de Licitações a definição dos preços manifestamente inexequíveis nos casos de contratação de obras e serviços de engenharia foi simplificada – mudou-se o percentual e excluiu-se um dos critérios previsto na Lei anterior, restando estabelecido que serão inexequíveis as propostas cujos valores sejam inferiores a 75% do valor orçado pela Administração Pública (art. 59, § 4º).
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